14 de agosto de 2020

livros infantis antigos e esquecidos

☆ POR QUE VOCÊ coleciona livros? — alguém já fez essa pergunta a um bibliófilo, para induzi-lo à autorreflexão? Como seriam interessantes as respostas, pelo menos as sinceras! Pois apenas os não-iniciados poderiam crer que não existe aqui o que esconder ou racionalizar. Arrogância, solidão, amargura — muitas vezes esse é o lado noturno de muitos colecionadores cultos e bem-sucedidos. Toda paixão revela de vez em quando os seus traços demoníacos, e nada confirma tão cabalmente essa verdade como a história da bibliofilia. Não existe nada disso no credo de colecionador de Karl Hobrecker, cuja grande coleção de livros infantis é agora divulgada ao público, através de sua obra. Para quem não se deixasse sensibilizar pela personalidade cordial e refinada do autor, nem pelo próprio livro, em cada uma das suas páginas, só poderíamos dizer o seguinte: esse tipo de coleção — o de livros infantis — só pode ser apreciado por quem se manteve fiel à alegria que experimentou quando criança, ao ler esses livros. Essa fidelidade está na origem de sua biblioteca, e toda coleção, para prosperar, precisará de algo semelhante. Um livro, ou mesmo uma página, e até uma simples imagem num exemplar antiquado, talvez herdado da mãe ou da avó, podem ser o solo no qual esse impulso lançará suas primeiras e delicadas raízes. Pouco importa se a capa está solta, se faltam páginas ou se aqui e ali mãos inábeis amarrotaram as gravuras. A procura de belos exemplares também é legítima nesse tipo de coleção, mas justamente aqui o pedante ficará perplexo. É um boa coisa boa que a pátina depositada nas folhas por mãos infantis pouco asseadas mantenham à distância o bibliófilo esnobe. ☆ 

Parágrafo inicial do artigo “Livros infantis antigos e esquecidos”, de Walter Benjamin (1924) que constam do primeiro volume das OBRAS ESCOLHIDAS: magia e técnica, arte e política, trad. Sergio Paulo Rouanet para a editora Brasiliense (1985) pp. 235-6 que nos lembrará também o quanto é polêmico o confronto com o passado, em toda e qualquer historiografia, mesmo a respeito de literatura infantil. É preciso reconhecer o perigo e o prazer de brincar entre os galhos de uma árvore em busca dos melhores ou mais inusitados sabores, contra os estereótipos da imprensa e da moda predominante, predatória #FiqueBem #FiqueFirme #FiqueEmCasa #AbreAspas2020

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