31 de maio de 2017

o que você faria se tivesse uma folha só?

Peter O.ô Sagae


Escrevi um poema  imaginando que, SE EU FOSSE UM CICLOPE, conseguiria mirar o mundo inteiro num rápido lampejo, como águia, luneta, furacão, e tudo conquistava –  logo veio-me a lembrança de Ulisses que feriu mortalmente o olho de Polifemo: se eu fosse um ciclope, deveria eu ser mais esperto do que o mais esperto dos heróis gregos. Poesia não é um bom lugar para vinganças. Inspirei-me de cautela: se eu fosse um ciclope, estiraria o polegar rumo ao horizonte para refrear meus inimigos ainda no mar...


Paralelamente, me aventurei com desenhos e lápis de cor. Ilustrar um poema? Que tarefa, talvez fosse realmente mais fácil criticar do que fazer. Se um verso vem e diz “gato“, a ilustração deve mostrar igualmente... um gato? Será que um olho não se parece bem mais com um peixe? E muitos olhos foram surgindo e me encarando, com jeito de pássaros, serpentes, protozoários e outras criaturas estranhas. Isso era divertido, pensei então: deixarei espaços em branco – para o leitor preencher com sua imaginação – e também com seus desenhos.


No começo, eu havia imaginado ciclopes selvagens. Porém, saiu a figura de um ciclope boy para dar cores ao outro lado do papel. Esse moleque foi desenhado a partir de algumas representações de deuses, monstros e heróis gregos, claro. Ele carrega raios como Zeus, tem uma barba verde como as algas do mar de Posseidon e anda nu por um azul que é água e noite, céu e órbitas de estrelas e olhos.


E pareceu razoável trazer uma embarcação antiga como o trirreme que possuía uma aparência mágica com olhos arregalados e rabo de peixe. De repente, vi o pequeno ciclope carregando um smartphone, o braço estendido adiante, pronto para tirar um selfie! Quem imaginaria um ciclope de verdade preocupado com o próprio euzinho? É que realmente ele ainda não é, por isso suspira, ah, se eu fosse um ciclope...

* * *


Então, é isso. Termino esta série de dez postagens sobre a produção independente, relatando uma experiência própria, ao publicar um poema no formato de fanzine, em março de 2017. Com uma única folha de papel dobrada e desdobrada em oito páginas, em uma face, e a imagem tamanho pôster, do outro lado. Certamente, os primeiros zines nasceram com a luz das máquinas xerográficas e eram em preto e branco em sua maioria; hoje substituímos a fotocópia pela impressão digital. Por aí afora, é interessante ver inúmeros tipos de zines utilizados como meio de expressão criativa e instrumento pedagógico com desenhos, colagens e um conteúdo bastante variável. SE EU FOSSE UM CICLOPE é uma apropriação, numa tiragem de 48 cópias, recortadas manualmente, numeradas e assinadas. Agora, eu sei – tem um ciclope no envelope!


Fotos publicadas no Facebook.
Foto adicional: Suryara Bernardi.


BabaYaga, oba!
Nossos livros têm histórias☺Agora, 2 no Telhado!

30 de maio de 2017

igual a uma língua de papel

Peter O.ô Sagae



O que é um livro?

O poeta Elias José costumava dizer – é uma caixa mágica que possui asas longas e leves, em uma metáfora motivada pela imagem que o objeto livro possui, mas... Se essa caixa for redonda (um prato de sopa de letrinhas), ainda poderá ser livro?


A Cia. Mafagafos, de Santa Catarina, vai logo nos avisando que um livro é um grande brinquedo, talvez compriiiiiido como um dia de fome, um brinquedo devorador como a Bernúncia que, bocarra aberta, vai passar... Porém é, ao mesmo tempo, um delicado e pequenino instrumento que entorta até pensamento – livro que devora e será devorado, panela que cozinha e alimento. Um livro é assim um jogo de oposições, uma esfinge com biquíni de crochê e rabo de leão!


No poema do músico e compositor Sig Schaitel, algumas ideias sobre o que é um livro são desdobradas, não só como linguagem figurada, mas literalmente, pelas dobras das páginas que vão abrindo e revelando um verso a cada vez e desenrolam-se igual a língua de papel. O projeto gráfico foi concebido por Aline Maciel numa coleção de três minilivros – LIVRO DE BRINQUEDO (Cultura e Barbárie, 2016). Talvez alguém venha pensar, se é um livro de brinquedo, não é livro de verdade, apenas faz de conta que é... Mas, isso importa?


As três pequenas plaquetes ou fanzines têm capa vermelho carmesim, verde forte e cor de abóbora; não possuem títulos à mostra, apenas o desenho de uma bicicleta, um antigo teddy bear e cubos de alfabeto móvel. A leitura, como parte de um jogo, já começa pela escolha por onde devemos começar. Pela cor preferida, pela ordem em que estão os minilivros dispostos, pela curiosidade, pelo gosto por um brinquedo?


Curiosamente, atrás do ursinho, encontramos uma narrativa em versos: Papagaio do papai... diga-se já, como muitos textos embebidos em tradições orais, temos aqui uma narrativa espacial que se articula através da justaposição de cenas, sem encadeamento lógico entre uma e outra, evidenciando a montagem acumulativa de situações. O tom é o humor e alguns trocadilhos “invisíveis”, não fosse a insinuação... Um papagaio que foi presente de aniversário, que não desce do poleiro porque dá trabalho, que faz um penteado diferente porque está ficando grisalho... e anda meio refratário, escondendo-se no armário. São rimas repetidas em que me embaralho. Mas, por favor, nunca pense um palavrão!

Como parece ser o forte da Cia. Mafagafos, a fala viva, a língua que se desdobra e faz rima, o último minilivro que abro traz um punhado de adivinhas. Ao oferecer diferentes gêneros verbais, cada livro de brinquedo possui seu próprio ilustrador: Pati Peccin, no primeiro título, Pamella Araújo e Muriel Machado, nos demais. O que é um livro? Fica aí a pergunta, juntamente aos jogos digitais, quando o papel exige que autores e leitores tornem-se amigos prestidigitadores...


P.S. Quem colocou estes minilivros na roda foi Silvana Gili
que me presenteou, disse adeus e foi se embora!

29 de maio de 2017

palavra, design, colagem

Peter O.ô Sagae


O mundo é certo em suas alternâncias, ou é dia, ou é noite. Às vezes, no entanto, o mundo oscila, faz um pouco de claro e de escuro, faz um pouco de frio e de calor – o mundo vai criando movimento, mas o sujeito indeciso balança a cabeça e pensa: que roupa eu visto, com que roupa eu vou? Assim sua vida, suave nem sempre, vai seguindo cheia de dúvidas... Talvez as crianças não me entendam, quando exclamo: não sei se caso ou compro uma bicicleta, se saio correndo ou fico tranquilo – e igual a mim, igual a você, é o Tomás com seus dilemas, seus problemas num jogo de Debora Barbieri, publicado juntamente ao coletivo literário BabaYaga.


TANTO FAZ, TOMÁS (2016) nasceu verbal inicialmente como um poema sobre um personagem que nunca sabe o que faz, movendo-se através de perguntas sem sair do lugar, porque esse Tomás não anda num zás... E havia uma brincadeira (será que posso eu contar?) que permitia aos versos serem lidos do começo ao fim, do fim ao começo #prontofalei Mas depois o próprio jogo jogou-se sozinho e trouxe um dilema, ao virar um livro-sanfona, era ainda o mesmo ou novo texto?


Às palavras, juntaram-se desenhos, colagens e design – porém, o mais importante: um sentido de leitura da esquerda para a direita. Não era mais o arranjo de versos que cabem num rápido lance de vista e, assim, poderiam ser lidos, de alto abaixo ou dos pés pra cima. Era necessário pensar em cada dobra no vai-e-vem do papel e fazer a leitura virar o Tomás de trás pra frente, da frente pra trás!


BabaYaga, oba!
Nossos livros têm histórias ☺

24 de maio de 2017

afogando em sonhos...

Peter O.ô Sagae


A primeira publicação autoral independente que conheci foi um pequeno livro azul clarinho, reprodução em xerografia, tiragem: 30 exemplares assinados pelo artista gráfico e ilustrador Nik NevesACQUA ALTA é um livro de imagem produzido em 2013, contendo uma das mais belas narrativas visuais que tenho visitado


– e poderia sempre repetir essa viagem às suas páginas, acompanhado, curiosamente, com o som do grupo de rock e neofolk italiano Calle della Morte, em especial o álbum Gente di malaffare (2005).


A ilustração foi realizada digitalmente, mas a impressão em preto provoca uma sensação de aguada de nanquim e o azul do papel que realça a fria ambientação das sombras da cidade de Veneza, com seus canais abraçando antigos prédios com pés na água, num labiríntico jogo de esquinas e histórias que por lá se perdem... É necessário concordar que a Sereníssima cidade realmente são duas; existe a Veneza dos turistas e dos apaixonados, dos passeios de gôndola, das construções em claros e escuros de rosa, vermelho, bege, tons de terra, amarelos variados e mármore, janelas verdes e brancas guarnições, uma cidade feita de máquinas fotográficas e selfies em suas pontes, lojas, máscaras, livrarias, cafés e muitas vozes; mas há a outra cidade que se perde na presença da outra – é a Veneza do silêncio.


A narrativa de Nik Neves orienta-nos por entre a vida agitada e o olhar encontra a personagem de uma menina de cabelos escuros e curtos, desacompanhada dos pais ou de qualquer outro adulto. Ao entrar em uma loja, ela coloca uma máscara sobre o rosto e o leitor, por um instante, vê através de seus olhos, seu ponto de vista. Tal recurso tão simples, comum e caro ao antigo cinema, toma a função de calar os ruídos da cidade e abrir a segunda parte da história. Em frente a um espelho, os gestos da menina tornam-se mais amplos, como se, de repente, sob as asas do disfarce, ela pudesse viver solitariamente o sonho das identidades ocultas pelas ruas da cidade...


Livre, correndo, a menina encontra a outra cidade no silêncio de Veneza. Penetra, então, na estreita Calle della Morte e, dobrando o cotovelo de um L, chega a um paço onde não há ninguém, ninguém vivo ou lendário, apenas uma pomba sobre o ladrilho de cimento secular... Contudo, alguém mais observa a menina!


A terceira parte da história começa com a resolução do suspense, mas introduzindo o clima de mistério com um personagem mascarado e a fantasia de arlequim. A partir de então, somos obrigados a seguir... afogando em sonhos – essa espécie de acqua alta, maré de outono que transforma nosso caminhar por entre os braços e os palácios de Veneza...

* * * 

É possível acompanhar toda a aventura de ACQUA ALTA no espaço Inutil Projetc, juntamente a outros trabalhos de Nik Neves.


O que se destaca para a leitura de quadrinhos e dos livros de imagem para crianças, essa espécie de livros ilustrados, é a capacidade do artista em articular rapidamente as cenas em uma sequência bastante clara, propondo soluções de continuidade entre uma imagem e outra, sem distrair o seu leitor – isto é, a história é apreendida pela ação da personagem, o cenário que se enriquece pouco e pouco, sem o desconforto de tentativas frustradas de “adivinhar” as relações de causa/efeito... O tempo fragmentado, com Nik Neves, vai se constituindo em um continuum por vezes mais iluminador e mágico do que vem acontecer em certas narrativas de literatura infantil.

23 de maio de 2017

observe o desenho

Peter O.ô Sagae


Dois cômodos anexos, vistos do alto, em perspectiva... eles são feito a letra E, com apenas quatro paredes e janelas (uma externa, outra interna). Você pode desenhar isso, seguindo minhas palavras? Talvez sinta falta de outra parede, mas seu desenho iria se parecer com o número oito de um relógio digital, não sei. Seu desenho deve ter um chão, um piso, mas não escolha colocar um telhado acima, não, não ainda. E há uma porta “redonda” na última parede que vemos, repetindo: você deve fazer o seu desenho em perspectiva. Treine e coloque a porta, como sói acontecer, abrindo passagem para longe, como se fosse atravessar o fundo do papel. É possível? Treine sua percepção, antes de prosseguir o próximo parágrafo. Use uma régua, e não um compasso. Um lápis. Uma borracha. E vamos começar outra vez: dois cômodos anexos como se fossem um E...


Observe seu desenho – ou projeto de desenho, construção, e verifique se o estranho sólido figura como solto no espaço branco do papel. Use sua capacidade máxima de abstração e imagine-se, veja-se, como uma linha vermelha tão maleável e frouxa como deve ser uma linha que deixou o carretel para trás. Então, você – isto é, a linha em que você se transformou, vai se projetar por este espaço virtual. Sua missão: entrar ao centro da primeira janela para dentro do cômodo, passar a segunda parede e alcançar a porta na última parede que temos no desenho em perspectiva. Agora você-vermelho atravessou o fundo do papel. Foi possível, com certeza.

A linha de sua imaginação se projetou para outro espaço, além da primeira página. Ávido, você deve estar ávido para alinhavar o próximo desenho. Qual seria?



Pois brincando com retas e a ilusão da perspectiva perfeita, a perspectiva renascentista, Catarina Abreu Sabino provoca nossa observação por espaços que só poderiam existir em nossa mente e no desejo do desenho na superfície do papel. Arquiteturas melindrosas e melífluas compõem ESPAÇOS FLUTUANTES (2016) que convidam o olhar a pastar a transparência vegetal do pergamenata naturale, lentamente, e então descobrir, nesta viagem, o humor das coisas insólitas.


Para não deixar o espectador totalmente desamparado, a autora e artista visual deu-nos uma linha vermelha para amarrar um espaço a outro, uma admiração a outra e a possibilidade de pensar: fossem assim os labirintos e os parques de diversão!


P.S. Talvez você me pergunte o que isso tem a ver com livros para crianças... Respondo: alguma coisa tem. Conceitos e formas de localização, raciocínio espacial, geometrias inventivas, non-sense e virtualidades como linguagem.

22 de maio de 2017

“no oceano não tem onça”

Peter O.ô Sagae


Bem simples, certamente bem mais simples que outras postagens desta série a respeito de publicações independentes próximas ao sistema literário para crianças, porém não menos importante, apresentamos aqui uma plaquete – ou seja, um pequeno impresso para divulgar obras de curta extensão: poemas, um conto ou outro tipo de texto breve e único, até mesmo um capítulo isolado de uma obra maior.





Uma folha de papel azul turquesa tamanho A4 vira um minilivro de oito páginas – vira também um pedaço do mar em seis poemas com leão marinho, baleia, lagosta, raia, polvo, tubarão, um cardume de sardinhas, peixe espada, caranguejo, um golfinho animado e sonho de pescador em forma de sereia. AQUÁTICA, do poeta Zhô Bertholini, com ilustrações de Guto Lacaz, tem o projeto gráfico assinado por Luzia Maninha e a produção de A Cigarra Edições (2016), de Santo André SP.


São seis quadrinhas bastante gaiatas para o pequeno leitor lembrar-se que “no oceano não tem onça”, mas, na poesia, há encontro de sonoridades entre as palavras.


17 de maio de 2017

a cidade dentro da gente

Peter O.ô Sagae


Às vezes procuramos um livro de imagem para crianças que nos traga diversão e um modo especial de olhar/entender o mundo, entre os títulos que costumamos vasculhar como literatura infantil – e não o encontramos... O que se interpõe sob tal rótulo são diferentes conceitos de quem compreendemos ser o leitor e o público do mercado editorial; o que é ser criança, o que é ser infantil para as pessoas que vivem da arte de fazer livros?

Pois, um dia online, espiamos uma novidade: era a editora Lote 42 com o booktrailler do livro de Rafael Sica, FACHADAS, em um desfile de ilustrações, um passeio à frente de muitas casas, velhos imóveis, por uma rua de sons, vozerio, pássaros, passos e outros mais...




Os traços de Rafael Sica mesclam o discurso visual descritivo, na reconstituição das velhas fachadas que viu em várias cidades, com situações de crítica social, referências culturais, cenas quase improváveis, por vezes irreverentes e imaginárias. Há, por exemplo, uma casa com vestígios de abandono e inteiramente fechada às costas de um morador em situação de rua coberto por um jornal; nos degraus de outra casa, quatro jovens cabeludos, aparentemente desocupados, são ou serão uma banda de punk rock nos idos ou bem-vindo ano de 1974; alguém sentado no sofá calmamente soltando fumaça pela boca, enquanto atrás dele labaredas escapam pela porta e janelas; então, em algum ponto da rua há uma parada de disco-voadores, noutro trecho da calçada emerge um submarino.


Cada fachada é uma metonímia, parte de uma casa-história, um fragmento de certo lugar. Porém, quando alinhadas por justaposição, criam uma nova paisagem, uma cidade que não existia antes de ser aberta através do livro. Povoar suas páginas com uma vizinhança inédita conduziu o projeto gráfico e a arquitetura do livro: uma folha de papel com quase três metros dobrada em sanfona. Então, que porção–criança ou estigma–infantil, encontramos neste livro de imagem?



Considero alguns ingredientes necessários, como parte da literatura contemporânea: invenção artística que desafia o olhar criativo-recreativo do pequeno-grande leitor a partir do suporte material e as próprias ilustrações; um toque de modernidade, em seu traço franco de desobediência aos cânones; e até um sabor de pós-modernidade que se configura pelo pastiche, ou seja, essa composição realizada com fragmentos de tantas coisas “o que leva o leitor a jogar com um desenho de relações que descentralizam e correlacionam pontos de vista, saberes, sonhos, anseios”, abertura do possível onde moram todas as coisas selvagens (felizes e curiosas).


P.S. Outras coisas ainda se pode contar. Diferentes “fachadas” servem ao livro do gaúcho Rafael Sica – um conjunto de oito capas foram feitas com quatro cartões coloridos (roxo, laranja, verde, grafite), com aplicação em serigrafia. No verso da folha que apresenta, ao todo, trinta casas, o leitor vai encontrar objetos, como uma luva, um guarda-chuva, uma máquina de escrever, uma dentadura, uma cuia de chimarrão etc. que se relacionam, de algum modo – pistas ou realce? – com as histórias entrevistas ao longo do percurso. Foto adicional: Cecilia Schiavo.


12 de maio de 2017

invisíveis, imaginárias

Peter O.ô Sagae


Existe a ideia corrente de que uma ilustração nasce, muitas vezes, em socorro ao texto verbal para iluminar seus sentidos. Até aí tudo bem... mas seria possível uma imagem esclarecer ou ampliar os significados de outro texto visual, já existente? Pois uma dupla brincadeira oferece a artista gráfica Gabriela Gil com suas CIDADES IMAGINÁRIAS (2016), um fotozine criado a partir de duas linguagens/intervenções...




As imagens acima encontram-se disponíveis no portfolio online de Gabriela Gil, uma das meninas do vlog . lagarta listrada . e você pode deter-se em cada um dos doze postais pelo tempo que for necessário para ver surgir (em sua mente) uma história, a partir da cena que observamos. Fotografia e desenho dobram-se ao princípio de montagem/estranhamento. São binômios potenciais.

A razão nos indica os lugares que a artista visitou e registrou em preto e luz e qualquer um de nós poderia percorrer: um parque, um recanto na praia, uma paisagem dentre prédios etc. A intervenção, à primeira vista, está no desenho em cores que justapõe ora um pássaro gigante, ora um unicórnio, à frente ou atrás de árvores; num casal de patos preparados para o banho correndo em um píer, numa sereia que acabou de mergulhar no remanso do mar. Então, embaralhando e desembaralhando os cartões, descobrimos um pequeno barco a velas azuis e amarelas atracado/navegando num braço de rio, água, lago à sombra de árvores... somos obrigados a buscar os links que entretecem uma nova narrativa.

Entre os diversos lugares, entre as diversas possibilidades, eu cá deslizo os pensamentos como um trem ou um urso sobre patins! E fico a perguntar, são realmente os desenhos que intervém na fotografia ou seriam estes cenários que dão movimento aos personagens e seus veículos retirados do repertório de livros e filmes da sessão da tarde?


Pois é isto: perguntas e imagens todas juntas podem acordar narrativas. Como um jogo, tão ao gosto das combinatórias que fizeram a felicidade de italianos inquietos, como Rodari, Calvino, Montanari...