19 de janeiro de 2011

um cara plausível impossível

por Peter O’Sagae



Qualquer moleque pode imaginar-se dois, alguém duplicado que faz e vê o que faz, ao mesmo tempo. Ser mais, ser múltiplo, ser piá ou guri, o tempo todo. Por dentro. Criar um rinoceronte debaixo da cama, conversar com Papai Noel enquanto ninguém está vendo. Napo faz dessas! A gente pode mesmo ir a outros lugares sem sair daqui. É bom saber voar, tirar os pés do chão, sentindo-se mais mágico. Qualquer um pode ver as coisas que normalmente quem vive olhando os próprios pés não enxerga. Ou não quer enxergar. É bom também quando os sentimentos vão para o alto, alto, alto. Napo é meio assim: nuvem de poesia e perguntas sobre o mundo inteiro. E respostas rápidas que ninguém sabe de onde ele tira! Napo, o menino que não existe? Existe e insiste em ser sempre um cara plausível impossível. Que é isso? Descubra, filosofando e divertindo-se a cada disparate, recordação, capítulo ou instante deste livro que é como um álbum — e Napo a sua principal figurinha. Rara.


Coleção Metamorfose

Intencional ou curiosamente, a coleção Metamorfose estreia com três autores nascidos nos três estados da região Sul do país, com três narrativas ambientadas em três cidades de lá. De Porto Alegre, o gaúcho Luís Dill escreveu O ESTALO, com ilustrações de Rogério Coelho e apresentação de Moacyr Scliar; natural de Brusque, Santa Catarina, Paulo Venturelli é autor de O ANJO ROUCO, ilustrado por Laurent Cardon e introduzido por Nelson de Oliveira na interna de capa; por fim, coube-me a leitura e escrever a respeito da obra de Edson Bueno — NAPO, UM MENINO QUE NÃO EXISTE, com imagens de Cris Eich e descrições que me chamaram à memória o cotidiano da parentela do interior paranaense. Um álbum de recordações, instantes... ou um álbum de figurinhas?


Outras imagens de Napo, no blog de Cris Eich [gota d’água no papel]

17 de janeiro de 2011

“O segredo para ser feliz Celina tem.”

e outros textos publicados em quartas capas


O segredo para ser feliz Celina tem. E o Léo também. Não está debaixo do boné, nem do chapéu, porque vai dentro da cabeça de cada um. E isso é o que muda tudo: um jeito de entender o mundo e olhar as pessoas.

Um segredo que tem sete letras. Sabe o que é? Tão gostoso como uma história para ouvir nos dias de chuva, um presente a toda hora, uma companhia no dia de aniversário... Um jeito de inventar a amizade.

* Para o livro CELINA, de Christina Dias, il. Elisabeth Teixeira (DCL, 2009).

um cartão-postal e o livro-envelope

da quarta capa para o blog ;-) e vice-versa

Conhece o Luiz Raul Machado?

Pois este autor enviou um sonho para você, dentro deste cartão-postal. Leia-o carinhosamente, vire página a página bem devagar para a água do lado não derramar. Uma fada triste espera o momento para dali escapar. E um menino todo silêncio aguarda o instante para lá mergulhar... Espie!

O que pode acontecer quando os sonhos navegam além dos brinquedos e barcos de papel? Soltam-se letras e imagem, em um livro ilustrado por André Neves. Um livro postal. É para guardar.

* Para o livro CARTÃO-POSTAL (DCL, 2010).


Imagine você uma vila onde as casas não têm teto, nem telhado. Lá vive Luana, debaixo de todo o sol e da renda de estrelas que iluminam seus pensamentos e desejos... Como ela gostaria de conhecer um pouco de outros lugares! E, um dia, dentro de um envelope, chegam cheiros e cores de chuva...

Com páginas que desdobram o lirismo do olhar de Ninfa Parreiras e das imagens de André Neves, o delicado livro-envelope abre-se às mãos do leitor.


* Para o livro UM TETO DE CÉU (DCL, 2009).

13 de janeiro de 2011

O alfaiate valente

texto da quarta capa assinado por peter o’sagae


Um simples alfaiate sai por terras distantes, usando um cinturão bordado com uma frase enigmática: “sete de uma vez”. Todos pensam que o jovem vencera sete homens de um só golpe... E logo o levam à presença do rei!

Neste conto popularizado pelos Irmãos Grimm, sorte e astúcia estão ao lado do rapaz. Em seu caminho, vemos surgir intrigantes personagens em meio aos cenários desenhados pela vívida imaginação de Olga Dugina e Andrej Dugin. Objetos aí se transformam em curiosas criaturas; plantas e animais em peças de vestuário, armas e arquiteturas bem ao gosto de Bosch e outros pintores medievais. Em uma aventura pela ilustração, o leitor descobrirá diferentes histórias paralelamente ao reconto de Arnica Esterl.



P.S. para Dobras da Leitura O’Blog

A efusiva ilustração do livro O ALFAIATE VALENTE, combinando o talento de Andrej e Olga Dugina (Cosac Naify, 2.ed. 2010), demanda um minucioso estudo das relações palavra&imagem. A narrativa tradicional coligida pelos Grimm descreve com humor a ascensão social de um simplório, ou mesmo tolo, alfaiate, fazendo-se passar por uma pessoa que verdadeiramente não é. Como um arquétipo, o alfaiate é um tipo de embusteiro que costura e pode trocar suas roupas conforme a ocasião. Ora, à medida que o herói e a história avançam nesta versão de Arnica Esterl, a ilustração volta na contramão das conquistas do personagem: vemos cada elemento humano perder suas características físicas, desnudando um sentido mais profundo e psicológico de contradições entre o ser e o ter. Tudo o que respirava se coisifica.

12 de janeiro de 2011

tem uma rua com lua cá dentro do baú

* texto de peter o'sagae para as internas de capa ou orelhas do livro


Mágico, poeta e cantor: este é o Raimundo Matos de Leão que aqui se mostra em cada ponto, em cada trama de seus textos para teatro. Um teatro que não traz um mundo pronto, daquele jeito que a gente se acostumou a olhar, mas vai sendo construído no relampear de palavras, feito aos poucos pouquinho, que se revela repentinamente brincante e inteiro ante os olhos do espectador.
Tear de gestos, o teatro dedicado para crianças me parece ser a grande arte das transformações, um jogo dramático, livre por excelência. Afinal, no teatro, podemos ser outro que não nós mesmos, podemos viver onde desejamos nos encontrar... Com gestos imaginativos, o palco, o picadeiro, um quintal, qualquer outro espaço que nos cerca, irá conter o mundo — caminhos de viajar. Nossa bagagem está dentro do antigo baú, todo instante é hora de partir. A cada passo, uma história.

Em "Brincadeiras", quatro personagens — feito gente que nem a gente, cabeça, tronco, braços e pernas — vão saindo do escuro e iluminam o próprio nome. Isso é bonito: a criação ganha existência e tudo mais pode acontecer... e, veja você, acontecem muitas coisas! Dá até vontade na gente de pular da cadeira para o palco, participar de verdade... Essa é a idéia que alinhava as curiosas "Estrepolias na ribalta".

Ritmo da palavra que trama a trama: eis o livro, eis o texto teatral "Quem conta um conto, aumenta um ponto" trazendo cinco estórias cadenciadas, resgate de nossa tradição oral. Costura de boa agulha, a voz é a corda que prende e acorde que desperta o canta-conto bailarino e brasileiro. Ritmo de Raimundo que é narrador da vida, narrador de mão cheia, mambembe e saltimbanco, giroflê, mascate e servidor de alegria.

E, no floreio de fitas e falas, por fim, a fogueira 'inda acesa é a memória generosa, cravo, rosa e manjericão: "Cai, cai, balão" faz baixar as cortinas desse livro. No crepitar do mundo, vamos nos encontrar com aquele tico de pessoa que fomos um dia — e desejamos, então, o retorno.

Tudo bem, que no baú tem sempre rua com lua.
Quem vem?


* Quem conta um conto, aumenta um ponto, de Raimundo Matos de Leão (Letras da Bahia, 2001) trata-se de uma obra selecionada pela comissão da Secretaria de Cultura e Turismo e Fundação Cultural do Estado da Bahia. Posteriormente, a peça homônima ao título da coletânea tornou-se um livro independente. Ver postagem abaixo.

ritmo da palavra que trama a trama

Dobras da Leitura 14


De Raimundo Matos de Leão, QUEM CONTO UM CONTO, AUMENTA UM PONTO, com ilustrações de Sérgio Palmiro (Saraiva, 2002)


... eis o livro, eis o texto teatral QUEM CONTA UM CONTO, AUMENTA UM PONTO, indicado ao Prêmio Mambembe de 1980 e que nos traz cinco histórias cadenciadas resgatando a tradição oral. No palco, um cantador movimenta os atores e a fantasia do público rumo a um grande festejo de cores!

Tão logo os atores se reúnem, o contador tira a primeira de cinco histórias que ouviu quando menino, sentado na porta da rua em noite de lua cheia. Tem rei, rainha e príncipe, é um velho conto de magia europeu com as desventuras do Príncipe Lagartão. Depois, sai a contar um caso de muito grude, a facécia ligeira e engraçada do macaco preso a uma boneca de cera, seguida pela história da Menina dos Brincos de Ouro que acabou presa no surrão, com a mítica figura do Homem do Saco. A quarta história é uma lenda que explica como rato, gato e cachorro tornaram-se inimigos. Por fim, uma façanha heróica de Lampião, acontecida num certo mês de fevereiro... No meio de muita poeira, quando o cangaceiro bota fogo no inferno e faz a diabada vir abaixo na hora em que a ripa vadeia!

É oportuna a publicação do texto de Raimundo Matos de Leão. Nas palavras de Regina Zilberman, “teatro para ninguém botar defeito, ainda mais porque valoriza a tradição popular, diverte, e dá a maior força para os que parecem dominados, mas têm coragem e energia suficiente para mudar sua sorte. Sua poesia e linguagem em tom brasileiro fazem a gente desejar se aprofundar em nosso folclore e em nosso teatro, abrindo caminho para, num passo seguinte, conhecer a obra de Ariano Suassuna, por exemplo.”