13 de julho de 2020

um pé de vento



☆ UMA VOZ DISTANTE chama Íris e um adeus põe-se no olhar. É tempo de voltar. É tempo de ir para casa e enfrentar distâncias. A menina vai porque sabe que o sol sempre retorna e amanhã é tempo de novas descobertas. E o menino Cristalino? De onde ele veio? Para onde ele foi? Ninguém sabe. Talvez seja imaginação transparente e brilhante como cristal. A árvore diz que ele ficou grudado nos olhos da menina. Por falar nisso, que tal subir numa árvore, pintar as folhas, sentir o vento? Aproveite agora que o dia passa ligeiro e tempo de criança é mansinho, mansinho. ☆


Um fim de história que deseja não terminar com suas metáforas, empréstimos e metonímias — UM PÉ DE VENTO, fábula poética e ilustrações de André Neves @neves.ilustra @projetoeditora (2007) pp. 29-30 #FiqueBem #FiqueFirme #FiqueEmCasa #AbreAspas2020




Abaixo, uma resenha publicada no site
DOBRAS DA LEITURA, Ano VIII - N.º 51 - jan. 2008

O amor poderá ser vento ou invenção? E um cata-vento também cata coração de menina? De onde virá o nome de cristal e hinos que pregará o amor nos olhos da menina? Desde a primeira vez que a viu, Íris não mais se separou da árvore. Com ela passava o tempo sentindo passar o vento, tanta afinidade entre a menina e a árvore, cada uma com seu temperamento.

Surpresa mesmo aconteceu no dia que vem depois de outro dia e a leve Íris encontrou um menino dormindo no silêncio da sombra da árvore. E fez um tudo para não despertar o sono que embalava o menino e ficar ali apenas olhando... Mas quis o vento, ou a invenção do autor, rodar o cata-vento que ela trazia nas mãos!


André Neves confabula imagens e ritmos, tanto em sua prosa quanto em sua ilustração, fazendo com que a utopia dos cenários — com flores, caracóis de ventos e texturas tingidas em turquesa, coral, ambarino, magenta, esmeralda e outras cores, ao fundo, — reflua para o interior de um discurso verbal cuidadosamente enrodilhado com escolhas lexicais reiterativas, tramando efeitos sonoros repetitivos que giram e variam frase a frase. Sobre estes relevos de sons e significados, no redemoinho do próprio texto, como na página ilustrada, parece existir uma coreografia realizada por ambos os personagens como se vivendo um gesto contínuo: “O menino despertou assustado, olhando para baixo, enquanto a menina olhava para cima, vendo o menino acordado.” Tudo isso provoca embriaguez, especialmente aos ouvidos, fazendo com que certas sensações permaneçam como extensão visual ou duração de um estado poético.

Há um um rico conjunto de imagens no texto verbal, como numa cena em que a menina corre “ao redor da árvore para rodar o vento no cata-vento”, enquanto o menino, mesmo parado e encostado à árvore, gira (seus olhos, sua atenção, sua vida) “como girassol sentindo o sol que brilhava nos olhos da menina” e “seu coração já rodopiava tão forte quanto o cata-vento na mão da menina”. Num texto assim, com espelhos e danças especiais, qual mesmo o nome do amor pregado à menina dos olhos dos olhos da menina?

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