26 de outubro de 2011

imagens como estribilho

peter o'sagae

Intrincado e belo livro de imagens de André Neves, Casulos (Global, 2007) vai inspirar cada leitor de uma maneira diferente e qualquer palavra dita ou escrita pode ser fatal, diminuindo as possibilidades de voo do leitor...

De par em par, de baixo para cima, as páginas aqui se abrem vistosas para os casulos de uma história que é tão só uma possibilidade poética, contornando uma cena narrativa mínima: uma menina de tranças e vestido barrado de flores sobe por uma haste verde, sem espinhos, até alcançar a rosa em botão; do alto, ela estende os braços para o voo nas asas de uma borboleta... O fim da pequenina cena é talvez o começo de uma aventura solta à lógica de certas imagens que a retina acumula e voltam insones, ante a vigília: imagens que se repetem como o estribilho de uma canção. No entanto, a cada vez, reiteradas, já possuem uma força diferente. E, como nos sonhos, os espaços não sucedem acontecer um após o outro, posto que se transformam em visões simultâneas: espaço contido dentro de outro, espaço abrindo-se a partir de outro.


Pois bem: de acordo com uma antiga fórmula alquímica, o que está em cima, também está abaixo como o céu e o mar em reflexo. Porém, conforme o olhar atravessa as páginas, descobrindo a composição das imagens, rarefaz-se o efeito, pois existe um ponto de apoio para o olhar não se perder: é um ponto de partida para a leitura: as páginas exigem que as ilustrações sejam apreciadas de baixo para cima, de um modo pouco convencional.


Livro-casulo que é também sua própria metáfora para fazer o leitor voar, buscando nexos para sua interpretação. Casulos que resumem o asilo para alegrias e tristezas da menina qual Mindinha num mundo de grandes e pequenos, de muitas e nenhuma asa, no exílio de si e dos outros.

* Extraído de Dobras da Leitura 48, setembro de 2007. 
** Tríptico com páginas de Casulos (2008) que utilizamos em cursos.

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