30 de março de 2013

uma escritora e o jabuti de ouro

peter o.sagae nos bastidores da leitura

Entre os escritores e ilustradores de literatura infantil, reza a lenda ou fábula de que o sujeito precisa de cuidados redobrados após conquistar um jabuti, o primeiro Jabuti com J maiúsculo... Não pense você em um animal de carapaça dura e fria: pense em um quelônio com letras às costas, no prêmio concedido anualmente pela Câmara Brasileira do Livro aos melhores do setor editorial.
Se o primeiro vem, nunca se sabe quando chegará o segundo... Dizem que todos os parentes são lentos! E resta aos premiados torcerem pacientemente por uma jabota – a fim de formar um casalzinho, assim que possível, e estabelecer família.


Contudo, em 2012, Stella Maris Rezende veio mineiramente nos contar outra história. Arrebatou, de maneira inédita, o primeiro e segundo lugares do 54º Prêmio Jabuti – Melhor Livro Juvenil, respectivamente com A mocinha do Mercado Central (Globo, 2011) e A guardiã dos segredos de família (Edições SM, 2011), título também vencedor do Prêmio Barco a Vapor 2010.
Foi uma noite de verdadeira estrela brilhando e, quem suspeitaria, vinte anos de espera, veteranamente Stella literária, candidata ao Livro do Ano de Ficção... e Stella Maris voltou ao palco da Sala São Paulo para abraçar o mais novo filhote, tão rápida assim é a felicidade de um casal promissor: um Jabuti de Ouro.


Meninos, eu vi... meninos, eu li! 

Com outro título, o texto de A mocinha do Mercado Central havia passado por minhas mãos, em maio de 2008, quando estive no júri de leitores críticos do Barco a Vapor. Era somente “Guia mágico para imaginar Maria” e já surpreendia por uma estrutura de capítulos justapostos como quadros pendurados à parede invisível da memória. Maria emoldurada por diferentes nomes, assumindo diferentes vidas, passando uma temporada ou uma chuva, como se diz, em diferentes cidades brasileiras... Mágico mesmo é essa coisa, essa ânsia de mudar o próprio mundo com uma palavra só, um nome. Maria sabe que precisa vestir-se com muitos nomes, para despir-se como personagem em busca de si mesma e de sua história, sonhos escapando pelos olhos, esperança e fragilidade no sorriso construído com gestos firmes. Stella Maris Rezende convida-nos para irmos lendo, lendo, imaginando o que sabemos sobre o perdão. Quando comecei a ler o livro ilustrado por Laurent Cardon e editado por Cecilia Bassarani, pensei: esse filme, eu já vi. E estava certo.

Coincidência ou não, no concurso do Barco a Vapor 2010, voluntariamente cruzava os dedos pelo texto de A guardiã dos segredos de família, sem atinar quem poderia ser a autora daquela escrita de ficção que, rompendo com o caráter linear, nos conduz a um universo poético, feminino e dramático. Trata-se de uma obra rica em recursos de linguagem e muitos vazios para o leitor preencher & recompor a história de Nenenzinha, menina ainda e tia de quatro órfãos: Niquinho, Chiquito, Quinzinho e Célia, batizados Antônio Francisco, Francisco Antônio, Joaquim Francisco e Célia Francisca, confiados ou confinados na casa de um parente e sua esposa má. Muitos personagens sob o mesmo teto, muitas falas em um mesmo texto, provocam a impressão de estarmos todos entre as três paredes de um teatro – sim, de algum modo, fomos convidados a tomar parte das cenas e estamos bem próximos a esta família, ouvindo as conversas, meias sentenças, palavra e meia, silêncio, a ponto de descobrir seus segredos...


Conheci Stella Maris Rezende em carne e osso, três dimensões, abraços e cores, ladeada por Mariângela Haddad e Vivina de Assis Viana, na noite do 6º Prêmio Barco a Vapor de Literatura Infantil e Juvenil, aqui em São Paulo. Esse encontro levou-me de volta ao primeiro livro de Stella que li e ao estilo tão monjolo, milho, mão de almofariz e beija-flor que bate direto no coração... Mas essa história fica para outro dia!

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