15 de junho de 2017

um pouco de junho e outros meses

peter O sagae


João chegou!
Trouxe com ele uma vontade de falar.
Trouxe um pouco de junho e outros meses.
João não é só um menino, são dois.
Talvez mais, em outros meninos chamados João.

É hora de apresentar UMA NOITE PARA JOÃO e outros poemas, com as delicadas ilustrações de Sandra Jávera (Paulinas, 2017).


Os poemas foram escritos entre junho e julho de 2015. Não eram intencionalmente poemas para crianças, quando dei início a uma homenagem aos três padroeiros das festas juninas, buscando evocar a missão de cada um deles – A caminho de Antônio, Entre os sonhos de João e Até o coração de Pedro. Meu gosto pelos temas do bumba-meu-boi me faria incluir São Marçal, louvado, em torno das fogueiras do Maranhão, no dia 30 de junho.

No entanto, o poema para João, ao retratar os sonhos do menino em um diálogo sem palavras com sua mãe, antes mesmo do nascimento, conduzia-me a novas imaginações... O que aconteceu, quando João deixou a noite do ventre? Como viveria João com seus segredos, ouvindo o vento ou o avô inventando uma desajeitada parlenda com nomes de inseto? Encontrava assim o fio condutor para um livro para crianças – puxei nomes e símbolos de lendas medievais, juntei vozes que atravessam o medo e a magia das noites.


Não sei bem como, apareceram duas figuras à minha frente, conversando como se estivessem em um arraial ou na porteira de um livro:
Vô, quem é
aquele menino
com o carneiro
na mão?

Aquele é João.

Ele também?

Também, João.
Sandra Jávera desenhou este João e o avô como se fossem caminhar para o fundo da página, o menino apontando o estandarte. No alto, o pequeno João Batista aparece de olhos fechados e também assim o carneirinho em seus braços. Ambos dormem. Ou fazem de conta... Virando a página, adentramos outro tempo e lugar. Isabel aquece o corpo grávido perto de uma fogueira. Na abertura seguinte, a mulher segura o filho no colo, enquanto uma fumaça branca, distante, aberta em bandeira, sobe ao pano de um céu lilás. As estrelas de Sandra são pontos e flores. O chão é outro tecido, azul.


No poema IV – “Canção do tempo”, uma porção de pontos espalham-se ao pé da página como sementes e poeira cósmica. Caminhos tracejados vão unindo pontos e estrelas, formam as raízes e o tronco de uma árvore. O menino parece que paira sobre um espaço infinito. Apenas um João, os galhos, as folhas e as bagas douradas da alfarroba têm cores encorpadas.

Índice de sonhos, dinâmico, o azul ressurge em diferentes tons – nas asas de um inseto, nas paredes do quarto do moderno João, na manta pontilhada de branco e no travesseiro, nos círculos concêntricos que envolvem o menino – o que, afinal, representam?


O azul ainda domina as bandeirinhas...


Em nossas conversas, Sandra Jávera escreveu: “Encantei-me com os quadros do Volpi. Eu já gostava de suas pinturas, e saber da relação com a Festa Junina me deixou ainda mais interessada. Penso que pode ser bonito uma dupla central cheia de cor e mais abstrata.” Ao fim de seis poemas sobre João, comparecem outros meninos. A segunda parte do livro começa em uma noite cinza...


No poema VIII – “Felicidade tem sete filhos”, o Sol é um gigante devorador de um olho só, enquanto a Lua personifica o bem possível, derramando sua cor de luz e leite. No poema IX, o vento vem e desenrola um tapete no alto de oito colinas, alinhava pétalas de rosa e dentes-de-leão e, por fim, costura sua história com a agulha do tempo – porém, talvez nada disso exista, ou existe, sonho de um menino enquanto brinca, Pedro que não é São Pedro.

Em meio a cores e traços delicados, o vocabulário visual de Sandra Jávera revela agradáveis surpresas. Certos detalhes se mostravam desde os esboços, como três pedras que formam a letra M no poema X – “Trás as histórias de Marçal”, enquanto o menino alimentava algumas aves. Na ilustração final, a ideia de generosidade se traduziu em um gesto entre suas mãos e as mãos de um macaquinho marrom. Todos os personagens de UMA NOITE PARA JOÃO e outros poemas foram vestidos com simplicidade, vivendo fora do registro histórico, porém bem próximos de nós. Viajamos por outros meses que talvez nem existam no calendário.


O livro vai terminando com uma sequência narrativa em três poemas, com o Menino Jesus, ele mesmo!, brincando no barro com água de chuva e riacho, numa manhã de sábado, para amolar e espantar José, seu pai... Querem saber?

No site da editora, você pode baixar um trecho do livro. Espero que gostem!

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