por pet:r o’sagae
“mesmo que ninguém
entenda nada
tudo é invenção”
Pois bem: livros como Num zoológico de letras, de Régis Bonvicino, com a programação visual de Guto Lacaz (Maltese, 1994), sempre me fazem lembrar histórias de sala de aula. Tive, por acaso, um aluno que me perguntava se eram importantes e qual a necessidade de aprender os três modos retóricos com que a palavra é carregada de significados, segundo as lições do ABC de Ezra Pound (1934) – melopéia, fanopéia e logopéia – nomes que, escritos à antiga regra, com acentos, figuram bem mais interessantes como esses pequenos insetos que estão nos jardins, com antenas zumbidoras e asas tortas transparentes. Porque a questão é essa: ouvir, ver e pensar com sensibilidade a poesia para crianças, sem perder o senso de humor. Possibilidades de descobertas dentro de uma só palavra, sem exigir versos longos ou explicadinhos, para descobrir mel no interior da palavra melancia. Pega o leitor e o embala com o som, uma visão (pessoal) e várias idéias. Que brilhem e pisquem.
Pois, então: Régis Bonvicino se avizinha da poesia visual no poema que dá título ao livro, único para o público infantil em sua produção. “Num zoológico de letras”, a imagem gráfica é quase sempre metonímia, ilustrando uma característica que permite o leitor vislumbrar o animal inteiro, em movimento, canto, urro, alarido, camuflagem, garras ou dentes. Em uma lista com 34 nomes, temos, lemos, vemos:
aa aa aa aa aa belhas
eLEFANTe
m:rc:g:
j%g%%t%r%c%
Tão simples como uma brincadeira de criança, Bichos tipográficos, do poeta, tipografo e editor Guilherme Mansur (Edições Dubolsinho, 2007), explora as diferentes características dos animais através do desenho de uma ou mais letras que compõem seus nomes. Assim, uma gaivota voa nas asas da letra v, um canguru pode carregar gentilmente o filhote na barriga da letra g. Por vezes, o nome do bicho vai tomando conta da página, espacializando-se discretamente, como um rinoceronte, ou toda-toda para chamar a atenção, como a letra f escolheu equilibrar a bola do O na ponta do próprio nariz, imitando uma foca, ou muitos zzzz ziguezagueando uma zebra veloz...
Por sua vez, Animais, de Arnaldo Antunes e Zaba Moreau, com ilustrações do Grupo Xiloceasa (Editora 34, 2011), brinca com deslocamentos, permutas e acréscimos de letras que facilmente poderiam ser tomados como erros. Ao contrário, o que se descortina é um jogo de encaixar nomes e coisas aos bichos que se transformam totalmente pelo exercício da imaginação. Tipo assim: vacaVAlo, MARIpousa, mosquiSIto, DormeDário... Parece difícil acreditar que esses novos bichos sejam, por si só, um poema. Mas são. Montados artificialmente através de um procedimento que os linguistas denominam amalgama e os poetas chamam de palavra-valise, a mistura de duas ou mais palavras, à base de trocadilhos sonoros ou visuais que levam ao riso – porque, em geral, acabam permitindo-nos ver/rever criativamente uma existência biológica e gramatical, cá entre nós, muitas vezes sem graça...
Muito sugestivos e pedagógicos.Adorei.
ResponderExcluirDelícia de post!
ResponderExcluirLica