25 de maio de 2011

D é para Dudu e sua decisão

peter o'sagae

O início dos anos 2000 na literatura para crianças é assinalado por uma obra pioneira na abordagem das relações de identidade, gênero e suas representações: O menino que brincava de ser, de Georgina Martins, com ilustrações de Pinky Wainer (3.ed. DCL, 2005), inaugura nova fase para o debate sobre os preconceitos e a tolerância dentro e fora de casa.


Dudu é o bom menino que o pai espera ver jogando futebol como um campeão. E Dudu vai e faz um gol, depois outro e mais outro para seu time. Contudo, compreenda você, sua vitória será outra e se chama decisão, pois não já precisa mais provar nada, nem enganar a ninguém porque não gosta de bola. O pai poderia até bater nele, colocar de castigo... Mas ele não iria mais jogar.

Das escolhas, Dudu tem pela frente a mais árdua: ser como se é, sem sofrer consigo ou com as provocações do mundo à volta. Desde sempre, o menino gostava de uma só brincadeira: a brincadeira de ser o que a imaginação permite, ora fada, ora bruxa, e até mesmo princesa... Meninas não podem ser príncipes, guerreiros e outros personagens valentes? Podem, mas quem vai entender o que na telha dá? A família é toda precaução e preocupações, a professora diz apenas que isso passa, Dudu tem apenas seis anos, e o endocrinologista nada encontra nele fora do normal, mas recomenda outro médico. Que sabe cuidar de pai e de mãe.

Apresentando assim os múltiplos pontos de vista, na interação personagem a personagem, Georgina Martins constrói um discurso narrativo que não receita nem doutrina comportamentos: deixa a história ser seu próprio caminho. Dudu irá emancipar-se dos sofrimentos que lhe vestem, escolhendo ser o menino de sempre — mesmo quando tem a chance, a seus pés, de passar três vezes debaixo de um brilhante e verdadeiro arco-íris.

Na quarta de capa, João Silvério Trevisan comenta como «o livro é lindamente ilustrado e coloca muitíssimo bem a questão da viagem identitária que provoca tanto exílio em crianças consideradas diferentes». As ilustrações de Pinky Wainer acomodam-se em um inteligente e sensível projeto gráfico que permite o livro brincar de ser flip-book! Passando rapidamente as páginas, Dudu parece voar, bailando entre estrelas, brincos, colares, vestindo as próprias fantasias sem jamais perder a si mesmo.

* Extraído de Dobras da Leitura 38, outubro de 2006.



Georgina Martins visita também os sonhos de um pai que deseja um filho valentão, enquanto o menino quer apenas ser bailarino... Tal pai, tal filho? foi publicado pela Scipione, com ilustrações de Sergio Serrano (2010).

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