30 de maio de 2017

igual a uma língua de papel

Peter O.ô Sagae



O que é um livro?

O poeta Elias José costumava dizer – é uma caixa mágica que possui asas longas e leves, em uma metáfora motivada pela imagem que o objeto livro possui, mas... Se essa caixa for redonda (um prato de sopa de letrinhas), ainda poderá ser livro?


A Cia. Mafagafos, de Santa Catarina, vai logo nos avisando que um livro é um grande brinquedo, talvez compriiiiiido como um dia de fome, um brinquedo devorador como a Bernúncia que, bocarra aberta, vai passar... Porém é, ao mesmo tempo, um delicado e pequenino instrumento que entorta até pensamento – livro que devora e será devorado, panela que cozinha e alimento. Um livro é assim um jogo de oposições, uma esfinge com biquíni de crochê e rabo de leão!


No poema do músico e compositor Sig Schaitel, algumas ideias sobre o que é um livro são desdobradas, não só como linguagem figurada, mas literalmente, pelas dobras das páginas que vão abrindo e revelando um verso a cada vez e desenrolam-se igual a língua de papel. O projeto gráfico foi concebido por Aline Maciel numa coleção de três minilivros – LIVRO DE BRINQUEDO (Cultura e Barbárie, 2016). Talvez alguém venha pensar, se é um livro de brinquedo, não é livro de verdade, apenas faz de conta que é... Mas, isso importa?


As três pequenas plaquetes ou fanzines têm capa vermelho carmesim, verde forte e cor de abóbora; não possuem títulos à mostra, apenas o desenho de uma bicicleta, um antigo teddy bear e cubos de alfabeto móvel. A leitura, como parte de um jogo, já começa pela escolha por onde devemos começar. Pela cor preferida, pela ordem em que estão os minilivros dispostos, pela curiosidade, pelo gosto por um brinquedo?


Curiosamente, atrás do ursinho, encontramos uma narrativa em versos: Papagaio do papai... diga-se já, como muitos textos embebidos em tradições orais, temos aqui uma narrativa espacial que se articula através da justaposição de cenas, sem encadeamento lógico entre uma e outra, evidenciando a montagem acumulativa de situações. O tom é o humor e alguns trocadilhos “invisíveis”, não fosse a insinuação... Um papagaio que foi presente de aniversário, que não desce do poleiro porque dá trabalho, que faz um penteado diferente porque está ficando grisalho... e anda meio refratário, escondendo-se no armário. São rimas repetidas em que me embaralho. Mas, por favor, nunca pense um palavrão!

Como parece ser o forte da Cia. Mafagafos, a fala viva, a língua que se desdobra e faz rima, o último minilivro que abro traz um punhado de adivinhas. Ao oferecer diferentes gêneros verbais, cada livro de brinquedo possui seu próprio ilustrador: Pati Peccin, no primeiro título, Pamella Araújo e Muriel Machado, nos demais. O que é um livro? Fica aí a pergunta, juntamente aos jogos digitais, quando o papel exige que autores e leitores tornem-se amigos prestidigitadores...


P.S. Quem colocou estes minilivros na roda foi Silvana Gili
que me presenteou, disse adeus e foi se embora!

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