31 de julho de 2011

a bola que passa tinindo...

peter o'sagae


Seria difícil escolher um livro que fosse um verdadeiro show de bola. No entanto, Hardy Guedes consegue por as palavras em campo para vencer – e convencer o leitor mais perna-de-pau a jogar no time da poesia. Com desenhos de Renato Moriconi, O BAILADO ESPORTIVO (Prumo, 2009) faz a bola e a rima rolarem terra, cimento, areia e gramado, descrevendo passes ousados e gols quase impossíveis, num clima de pura euforia. A ilustração é um drible em duas cores no movimento ligeiro da palavra com a imagem.


Como se faz gol de bicicleta?
Com Moriconi e Maurício Negro.


* Imagem extraída do [livro abaixo].

30 de julho de 2011

olha aí, meu leitor

Tem frutas que nunca vi, nem mesmo ouvi falar, mas agora deu para aparecer em livro: no pregão que Maurício Negro inventou — e, talvez, nenhuma outra forma popular fosse tão atraente para o autor e ilustrador, que também é publicitário, para anunciar sabores 100% nacionais ;-) E sabe o que mais? QUEM NÃO GOSTA DE FRUTA É XAROPE (Global, 2006).

Evocando os vendedores ambulantes das feiras e ruas, o longo poema se deixa percorrer por uma melodia de nomes incomuns: pajurá, coité, bilimbi, penão, macaúba, murumuru, grumixama, licuri, camboim, enfim, quase um trava-língua batucado por nosso sotaque tupi.

A todo momento, um nome de fruta estala na boca: cajá-manga, urucaba, tucumã, jaracatiá, monguba... Alguns lembram palavras conhecidas, nome de cidade, bairro, peixe, madeira, praia ou algum ponto turístico. São frutas realmente não muito fáceis de encontrar, pois escondem-se pelas florestas, cerrados, lavrados, veredas, sertões deste país. E, na ginga dos versos, a malícia típica do comerciante popular, através de sua máximas, advertências, facécias e ditos chistosos. Sabecomé, moça bonita não paga, mas também não pega...


Nas ilustrações do livro, desfilam mulatos, frutos de nossa terra, e as paisagens típicas da feira urbana, terreiros, tabas, palafitas, o Corcovado, o caudaloso Amazonas... As imagens foram feitas com um pirógrafo e coloridas com tinta acrílica e anilina diluída em extrato de banana. Bacana!

* Extraído de Dobras da Leitura 37, setembro de 2006.

29 de julho de 2011

vem ver o circo de verdade

peter o,sagae

O circo é um lugar dentro do coração, afirma Alexandre Brito ao encerrar o livro CIRCO MÁGICO: poemas circenses para gente pequena, média e grande, com ilustrações de Eduardo Vieira da Cunha (Projeto, 2007). E é preciso realmente concordar. Debaixo do teto de lona, a imaginação encarna formas e cores, voa sob o olhar atento do respeitável público. Dentro do circo, há o incerto instante da corda bamba e do globo da morte, a destreza da moça que engole fogo, a balbúrdia dos filhos do palhaço, o silêncio do leão frente ao domador, a confiança da mulher do atirador de facas... Perigo e poesia que fazem a vida rir, respirar mais fundo, “cego aplaudir, mudo gritar”. Do bilheteiro à família de trapezistas, cada personagem vem aqui se apresentar com humor, força elegante e sincera humanidade. Vai, vai, vai começar a brincadeira ;-)

28 de julho de 2011

dentro de um paletó

Dobras da Leitura recebeu...

TARZAN, O FILHO DO ALFAIATE é uma composição bem humorada de Noël Rosa e Vadico. Um samba que conta a história de um esquálido malandro que fez fama de fortão, passeando por Copacabana dentro de um paletó todo engomado... Canção de 1936 que virou livro ilustrado por Rafael Silveira (Formato Editorial, 2010).


27 de julho de 2011

“como se escreve o tamanho do tempo”

peter o.sagae


O tempo e a leitura coincidem em certas marcas, letras, horas, vozes: disso estou quase seguro. Voos que não se repetem, presente que não se embrulha, manhã ou primavera que se guarda na memória, amizades. Assim, a cada visita a um texto de Bartolomeu Campos de Queirós, encontramos algo que não se consegue tocar outra vez, posto sentimento que passa mais depressa que passarinho: os pousos nas pausas serão sempre novos, modificando o que imaginávamos saber, saboreando o que antes não fora pressentido.



TEMPO DE VOO, texto que nos leva para dentro da gaiola vazada do tempo, destrava o lugar dos encontros entre o velho e um menino, em um diálogo de descobertas sobre o instante presente e o antes vivido. Duas vozes, suas muitas interrogações, a mesma teima em compreender o tempo que modifica tudo no mundo. “Ele muda a história, desvia águas, come estrelas, mastiga reinos, amadurece frutos, apodrece sementes. Nada fica fora do tempo. Moramos dentro dele, impedidos de abraçá-lo. O tempo foge para não ser amado. Quem ama para e fica. O tempo foge.”

Livro ilustrado pelo espanhol Alfonso Ruano, com a inspiração e a força de imagens surrealistas, publicado primeiramente no México (capa dura), antes de chegar ao leitor brasileiro: TIEMPO DE VUELO (Ediciones SM, 2008), TEMPO DE VOO (Comboio de Corda, 2009).

26 de julho de 2011

"a luz é seu tesouro"


Porque o exercício do poeta é tornar semelhantes os diferentes, Bartolomeu Campos de Queirós revela, com humor ingênuo e zelo, voos adivinhados dentro do ovo, cantos, asas que elevam anjos e aves ao céu mais cor de flauta... Mansamente, o autor desperta espantos do ninho das palavras e, então, acalenta o cotidiano e a imaginação como feitos da mesma matéria.

Seja lá “noite clara de prata” ou “dia com brilho de ouro”, no voo lúdico destes versos, o pequeno leitor pode comparar e permutar os objetos oferecidos à sua percepção: o ovo, a ave, a clara, a gema, a terra, o mar, o ar leve... às vezes cantos e rezas — e descobrir simpaticamente porque “é preciso duas casas para menino virar anjo”. Eis aí um antídoto contra pensamentos rasteiros, ainda que qualquer criança esteja distante de saber o que veio nos contar Octavio Paz: “cada imagem — ou cada poema composto de imagens — contém muitos significados contrários ou dispares, aos quais abarca ou reconcilia sem suprimi-los”. Ela bem o sabe, instintivamente. Por instinto poético.

Nas ilustrações de O OVO E O ANJO, em sua primeira edição (Global, 2007), Helena Alexandrino recria bonitos motivos sugeridos pela poesia de Bartolomeu. Escolheu a semelhança delgada da cegonha para representar a afeição humana das aves, fez anjos canoros e também anjos que são meninos em estripulias pelas paisagens tingidas de aurora, verde-água e diluições em cobalto, desenhou ninho de ovos e ninho que é colo de mãe. E olhos sempre fechados, como afirmando que a poesia é uma visão íntima aos sonhos. Na capa, símbolos dançam e se abraçam mágica e devotadamente. Ave e anjo se tocam na cumplicidade de oração, carinho mútuo, envolvendo com suas asas o mundo onde pousa o pé do menino buscando voo. É um mundo todo guardado como o tesouro de um ovo.

* Extraído de Dobras da Leitura 51, começo de 2008.


Já na segunda edição de O OVO E O ANJO (para obedecer acordos e desacertos ortográficos, vôo sem circunflexo pairando no mundo), em 2009, as artes de Lélis modifica fortemente a ambientação da leitura dos poemas. O aspecto lúdico e festivo em tons suaves de rosa, azul, verde, cede agora espaço para representações mais realistas de anjos e antigas cidades que parecem despovoadas em um conjunto predominantemente sépia.

25 de julho de 2011

para criar passarinho(s) e leitores

Dobras da Leitura recebeu...

«Para bem criar passarinho é urgente
apenas contentar-se com o desejo de tê-los na palma da mão. E isso se alcança ao imaginar-se acariciando as suas penas com cuidados invisíveis e os afagando apenas com o olhar, sossegadamente.
»

Fragmento do livro-lição PARA CRIAR PASSARINHO, de Bartolomeu Campos de Queirós. Original de 2001, em terceira edição com projeto gráfico e ilustrações (silenciosas e com ligeireza de asas) de Guto Lacaz (Global, 2009). Nas trilhas da literatura, tem [a primavera primeira e amores mais] de Neide Medeiros Santos por este livro...

19 de julho de 2011

cordel é um belo novelo

Peter O’Saga-ê


Com sua dezena de folhetos de histórias, dentro da mala que vai aconchegada ao peito, Assum Preto lá vai aos solavancos e nas rimas assonantes de UM PAU-DE-ARARA PARA BRASILIA, cordel de João Bosco Bezerra Bonfim, com ilustrações de Alexandre Teles (Biruta, 2010) que retrata, contrastante, a magia da memória literária e a vida do destino retirante. Quantos dias de estrada, quinze ou vinte dias, nem o motorista sabe... O que muda fora é a paisagem; dentro do peito, Assum Preto leva outro sentimento: um amor por Brasília, a jovem com nome de cidade, que partiu um dia antes nessa mesma viagem.

João Bosco dá vida ao cordelista e à moça de muita coragem. Citações a outras histórias nessa história é algo que não falta, pois foi um Fausto desalmado, no horizonte da desgraça, que muito mal inspira ao cantor com nome de pássaro e canção, a ela-moça-cheirosa e sua família. O pau-de-arara atravessa Pernambuco, Ceará, Bahia e Goiás rumo a capital brasileira, cenário de uma nova-velha novela... E o canto VI é explícito em seu título: “A donzela entra na guerra”. É Brasília procurando emprego, fosse de risco ou pesado, pelejando de bravo e valente peão, ninguém notando, pois, sua fêmea condição...

Ainda que um ou outro
Se pegasse a admirar
Os seus olhinhos pequeninos,
Convites de mergulhar,
Mas logo se censurava
Frente ao desejo ímpar.


Enquanto isso, num outro canto da cidade, Assum Preto lê folheto bonito para a sua freguesia, como a Princesa da Pedra Fina ou Juvenal contra o dragão... O tempo roda, o tempo passa, e entre roda gigante e bandeiras, numa festa mais iluminada que quermesse, acontece a inauguração da cidade, recebendo toda aquela multidão. Já se sabe, não se sabe, como faz o cantador para encontrar a amada?

Melodia sem Brasília,
Para que Brasília existe?

18 de julho de 2011

cordel é guerra, xácara e beleza

Peter O’ Tempos atrás


Apregoadas são as guerras
entre França e Aragão!
Ai de mim que já sou velho,
as guerras me acabarão...

Eis que aí a rima repica como um coração, aflito tambor, e soe talvez a voz (que narra e passa verso a verso) uma flauta. No fundo do peito, um medo — um rei a perder o reino, dararão, na indesejada derrota porque não tem filho varão... Eis que a filha mais moça, cabelos compridos, olhos claros, mãos pequeninas, pés delicados, com toda a resolução, brada, venham armas e cavalos, e vai à marcha do batalhão...

Esta famosa xácara espalha-se por muitas tradições da narrativa popular em verso, adaptado ao cordel brasileiro ou ainda na forma de rimance tão ao gosto medieval e nordestino. A história possui três momentos definidos, (1) iniciando-se com a lamentação do rei e a decisão da donzela que seguirá para guerra, sob as vestes de homem; aí os diálogos encenam a discussão entre pai e filha; (2) ao fim da batalha, vitoriosos, os cavaleiros descansam ao paço de um jovem príncipe que, torturado pela incerteza e a visão dos olhos do companheiro (que são de mulher, de homem não), aconselha-se e improvisa ardis para conhecer a verdadeira identidade do ‘amigo’; após várias tentativas, a jovem desnuda-se frente ao companheiro, sem resistir ao amor, revelando suas formas de donzela, mas (3) chega um pajem com uma carta com notícias de que o velho rei está a finar e, de volta à casa, o pai dá sua benção ao par.

O tema verdadeiramente universal da donzela que vai à guerra ouvi, em 1992, pela primeira vez, rodando “os olhos tristes da fita” de uma gravação doméstica em áudio k7, num registro do espetáculo Prazeres do Baile, de música profana brasileira dos séculos XVIII e XIX, produzido por Anna Maria Kieffer, Rodolfo Nanni e o Confraria - Conjunto de Música Antiga, apresentado, em 1982, no Teatro Castro Alves de Salvador. A história me apaixonou. Passaria um ano com a melodia repetindo apenas em minha cabeça, pois havia o pavor justificável de perder a gravação por qualquer acidente até que viesse a oportunidade de encaixar a narrativa em um dos programas de rádio que assinei. No balanço do balaio. Chegava-me também às mãos, antecipadamente, o livro do escritor português António Torrado, com ilustrações de Daisy Startari (Vale Livros, 1994), em uma forma adaptada sobre os versos coligidos por Almeida Garret. Fiz lá uma colagem sonora de tempos e espaços, voz cantada, voz falada... Pelos tempos que também andei noutras guerras, em 2002, subindo e descendo o Pelourinho, encontrei o CD do Quarteto Cantares: Romances tradicionais na Galícia e na Bahia. Eia, ela, em outras versões, donzela em som estéreo. Por fim, no dia 11 de março de 2010, no Teatro Anchieta de São Paulo, a estreia do espetáculo Donzela Guerreira, com o grupo Anima. Paixão contínua!


Grupo Anima, na formação do espetáculo Donzela Guerreira, inspirado pelo livro de Walnice Nogueira Galvão (Senac, 1998): Gisela Nogueira (viola de arame), Luiz Fiaminghi (rabecas), Marília Vargas (soprano), Marlui Miranda (voz e instrumentos indígenas), Paulo Dias (percussão afro-brasileira), Sílvia Ricardino (harpa) – e minha vizinha!, Valéria Bittar (flautas doce renascentista, barroca e indígenas brasileiras). No próximo vídeo, segundo e terceiro entrechos da xácara, conforme uma versão baiana do romance, com um fragmento de Grande sertão: veredas, próximo ao final do espetáculo.

14 de julho de 2011

cantando o cotidiano... alheio!

Peter O~Sagae


Mais facilmente que um camelo passar pelo Buraco da Agulha, atravessa o olhar de Socorro Acioli pelo buraco de uma fechadura! Neste INVENTÁRIO DE SEGREDOS, ilustrado por Mateus Rios (Biruta, 2009), descobrimos como os moradores de Urupemba estão irremediavelmente enredados na vida uns dos outros, sem tirar nem por uma letra a mais no alfabeto...


Garanto que a Amadeu a ama não deu leite furtado... Mas, o rapaz roubou o coração de Belinha e ela, sem ter do seu próprio, decidiu tomar o amor do Carteiro por quem o primeiro suspirava. Não deu em nada o desejo de vingança e desforra, pois o jovem admirava Dulcinéia, sempre à janela. Por causa do carteiro, sim, e uma carta de um tal de Ernesto, castigado pela sina, filho de Dona Firmina... Segredo é coisa que realmente não para, nem cala e vai ressuscitando o passado da boca de quem já ouviu muito pecado!

Socorro Acioli inventa trovas e sextilhas, engatilhando o leitor na vida alheia, mexendo com gente pobre, mexendo com gente rica, passando por muito amor, com humor, histórias de quem perdeu a estribeira e outras esperanças, bulindo com assombração e mesmo pessoa santa... Até Z! Haja fôlego, Socorro! Quem mais canta?

* * *
Passo a palavra para a Prof. Neide Medeiros Santos [nas trilhas da literatura]

12 de julho de 2011

cordel é poesia do sertão, 1

peter o'sagae


Uma caixa com três livros, cada qual com uma história e um folheto. De cordel — é assim a coleção PALAVRA RIMADA COM IMAGEM, de Rosinha Campos (Projeto, 2010) que recontou e ilustrou três aventuras escritas e celebradas há mais de um século por Leandro Gomes de Barros (1865-1918), considerado o primeiro escritor de literatura de cordel e um dos maiores poetas populares.


Introduzindo os leitores no universo das narrativas rimadas do grande cordelista paraibano — radicado no criativo estado de Pernambuco, o único cujo nome tem dez letras, sem nenhuma repetir! —, Rosinha acabou optando por uma adaptação resumida em prosa e destacar os principais momentos de cada história com suas ilustrações, gravadas em madeira com a colaboração de Meca Moreno e Davi Teixeira. Ao final dos três livros, todo o texto em sextilhas de Leandro Gomes de Barros surge encartado:

cordel é poesia do sertão, 2


A HISTÓRIA DE JUVENAL E O DRAGÃO inicia-se numa situação de apuro, numa região onde era comum o sacrifício de moças bonitas... E eis que chega a vez da princesa, tal como aconteceu a Andrômeda, remontando motivos bem conhecidos desde os mitos da antiguidade e sua apropriação pelo imaginário medievo. Desta maneira, Juvenal é um misto de Perseu e São Jorge. Mas, depois da façanha de matar e arrancar os dentes do dragão, o jovem sente que precisa correr mundo para provar sua valentia — e vai. Está aberta a brecha para a desgraça: um cocheiro se faz passar pelo herói e toma a mão da filha do rei. A doce jovem reza muito e Juvenal, longe, longe, tem a visão dos acontecimentos num sonho, voltando para por um fim à farsa...


A HISTÓRIA DA GARÇA ENCANTADA tem também enredamento de conto e principia com as graças de uma ave que se transforma em uma bela jovem, elemento bastante comum nas narrativas orientais. O herói aqui chama-se Gelmires e ele precisa guardar segredo dos fatos particulares e cheios de magia — mas o moço, língua nos dentes, revela tudo para um amigo e lá se vai desaparecendo a princesa que lhe valia a vida! Daí é um corre de lá pra cá, por entre reinos, sortilégios, estradas e ameaças, uma confusão de amor e morte, Gelmires contra Valdemar, feiticeiros de cada lado da história... Mais transformações e metamorfoses: pois seria tudo um sonho no carnaval da natureza?


A PRINCESA DO REINO DA PEDRA FINA, por fim, conta a história peralta do mais moço de três irmãos que só queria ver as pernas das moças de pernas finas ;-) É José que o pai expulsa de casa, mas quis a sorte lhe acompanhar: no rio, encontra um brilhante que vende para o rei por uma verdadeira fortuna. Contudo, o rei tem um barbeiro que é um diabo encarnado e esta aventura sai aos moldes das primeiras, com muitas estripulias, pelo reino das laranjeiras que é como o Jardim das Hespérides, caminho cheio de delícias, maravilhas e perigos.


Como podemos conferir nessa sequência, a imagem gravada na madeira não é transposta para o papel como uma xilogravura tradicional. Rosinha optou ilustrar os livros com as matrizes em madeira! Palavra rimada com imagem, numa caixinha de bom parecer: que outros artistas saberiam fazer?

11 de julho de 2011

porque a imaginação é um tesouro que se tem

comentários de peter o'sagae


Quatro versões de histórias da oralidade nordestina: é com este subtítulo que Arlene Holanda abre as páginas de seu CORDEL DE TRANCOSO, com ilustrações de Jabson Simões (Conhecimento Editora, 2009) — e, com muita maestria, ela tira versos muito fáceis de recitar.

“Enquanto o sertão não vira mar” resgata uma antiga profecia ditada por muitos beatos, Frei Damião, padim Cícero, Antônio Conselheiro, Zé Lourenço, entre outros visionários de uma outra realidade, de um fatal e líquido destino. É um canto-todo-convite que autora oferece para adentrarmos no clima de maravilhas e bendição, imaginando o dia em que as sereias virão se enfrentar em memoráveis duelos como fazem os cantadores de desafio em terra seca.

Depois, vem “A maldição da botija”, uma variação sobre as histórias da botija de ouro e o lugar desconhecido onde foi enterrada. Rezam as lendas que a alma dos antigos proprietários podem aparecer no caminho de algum desavisado para doar o tesouro; no entanto, é preciso de muita valentia para cumprir com as tarefas exigidas...

O terceiro cordel vem narrar e celebrar “O Reino da Pedra Furada”, dos encantos da mouraria, a princesa transformada em dragão, às areias e águas de Jericoacoara. Por fim, “A história do vaqueiro Damião que não tinha medo de assombração” e encontra visagens de boi Meia-Noite, Batatão e Mandingueiro em seu destemido caminho.


Qual ferro em couro de boi
A lição ficou gravada
Em seus mistérios, a vida
Inda não foi revelada.
Mas uma coisa é certa:
Precisa ser respeitada
.